terça-feira, 25 de novembro de 2008

O Ex-Covarde (Nelson Rodrigues)

Entro na redação e o Marcelo Soares de Moura me chama. Começa: - “Escuta aqui, Nélson. Explica esse mistério.” Como havia um mistério, sentei-me. Ele começa: - “Você, que não escrevia sobre política, por que é que agora só escreve sobre política?” Puxo um cigarro, sem pressa de responder. Insiste: - “Nas suas peças não há uma palavra sobre política. Nos seus romances, nos seus contos, nas suas crônicas, não há uma palavra sobre política. E, de repente, você começa suas “confissões”. É um violino de uma corda só. Seu assunto é só política. Explica: - Por quê?”

Antes de falar, procuro cinzeiro. Não tem. Marcelo foi apanhar um duas mesas adiante. Agradeço. Calco a brasa do cigarro no fundo do cinzeiro. Digo: - “É uma longa história.” O interessante é que outro amigo, o Francisco Pedro do Couto, e um outro, Permínio Ásfora, me fizeram a mesma pergunta. E, agora, o Marcelo me fustigava: - “Por quê?” Quero saber: - “Você tem tempo ou está com pressa?” Fiz tanto suspense que a curiosidade do Marcelo já estava insuportável.

Começo assim a “longa história”: - “Eu sou um ex-covarde.” O Marcelo ouvia só e eu não parei mais de falar. Disse-lhe que, hoje, é muito difícil não ser canalha. Por toda a parte, só vemos pulhas. E nem se diga que são pobres seres anônimos, obscuros, perdidos na massa. Não. Reitores, professores, sociólogos, intelectuais de todos os tipos, jovens e velhos, mocinhas e senhoras. E também os jornais e as revistas, o rádio e a tv. Quase tudo e quase todos exalam abjeção.

Marcelo interrompe: - “Somos todos abjetos?” Acendo outro cigarro: - “Nem todos, claro.” Expliquei-lhe o óbvio, isto é, que sempre há uma meia dúzia que se salve e só Deus sabe como. “Todas as pressões trabalham para o nosso aviltamento pessoal e coletivo.” E por que essa massa de pulhas invade a vida brasileira? Claro que não é de graça nem por acaso.

O que existe, por trás de tamanha degradação, é o medo. Por medo, os reitores, os professores, os intelectuais são montados, fisicamente montados, pelos jovens. Diria Marcelo que estou fazendo uma caricatura até grosseira. Nem tanto, nem tanto. Mas o medo começa nos lares, e dos lares passa para a igreja, e da igreja passa para as universidades, e destas para as redações, e daí para o romance, para o teatro, para o cinema. Fomos nós que fabricamos a “Razão da Idade”. Somos autores da impostura e, por medo adquirido, aceitamos a impostura como a verdade total.

Sim, os pais têm medo dos filhos, os mestres dos alunos. o medo é tão criminoso que, outro dia, seis ou sete universitários curraram uma colega. A menina saiu de lá de maca, quase de rabecão. No hospital, sofreu um tratamento que foi quase outro estupro. Sobreviveu por milagre. E ninguém disse nada. Nem reitores, nem professores, nem jornalistas, nem sacerdotes, ninguém exalou um modestíssimo pio. Caiu sobre o jovem estupro todo o silêncio da nossa pusilanimidade.

Mas preciso pluralizar. Não há um medo só. São vários medos, alguns pueris, idiotas. O medo de ser reacionário ou de parecer reacionário. Por medo das esquerdas, grã-finas e milionários fazem poses socialistas. Hoje, o sujeito prefere que lhe xinguem a mãe e não o chamem de reacionário. É o medo que faz o Dr. Alceu renegar os dois mil anos da Igreja e pôr nas nuvens a “Grande Revolução” russa. Cuba é uma Paquetá. Pois essa Paquetá dá ordens a milhares de jovens brasileiros. E, de repente, somos ocupados por vietcongs, cubanos, chineses. Ninguém acusa os jovens e ninguém os julga, por medo. Ninguém quer fazer a “Revolução Brasileira”. Não se trata de Brasil. Numa das passeatas, propunha-se que se fizesse do Brasil o Vietnã. Por que não fazer do Brasil o próprio Brasil? Ah, o Brasil não é uma pátria, não é uma nação, não é um povo, mas uma paisagem. Há também os que o negam até como valor plástico.

Eu falava e o Marcelo não dizia nada. Súbito, ele interrompe: - “E você? Por que, de repente, você mergulhou na política?” Eu já fumara, nesse meio-tempo, quatro cigarros. Apanhei mais um: - “Eu fui, por muito tempo, um pusilânime como os reitores, os professores, os intelectuais, os grã-finos etc, etc. Na guerra, ouvi um comunista dizer, antes da invasão da Rússia: - “Hitler é muito mais revolucionário do que a Inglaterra.” E eu, por covardia, não disse nada. Sempre achei que a história da “Grande Revolução”, que o Dr. Alceu chama de “o maior acontecimento do século XX”, sempre achei que essa história era um gigantesco mural de sangue e excremento. Em vida de Stalin, jamais ousei um suspiro contra ele. Por medo, aceitei o pacto germano-soviético. Eu sabia que a Rússia era a antipessoa, o anti-homem. Achava que o Capitalismo, com todos os seus crimes, ainda é melhor do que o Socialismo e sublinho: - do que a experiência concreta do Socialismo,
Tive medo, ou vários medos, e já não os tenho. Sofri muito na carne e na alma.

Primeiro, foi em 1929, no dia seguinte ao Natal. Às duas horas da tarde, ou menos um pouco, vi meu irmão Roberto ser assassinado. Era um pintor de gênio, espécie de Rimbaud plástico, e de uma qualidade humana sem igual. Morreu errado ou, por outra, morreu porque era “filho de Mário Rodrigues”. E, no velório, sempre que alguém vinha abraçar meu pai, meu pai soluçava: - “Essa bala era para mim.” Um mês depois, meu pai morria de pura paixão. Mais alguns anos e meu irmão Joffre morre. Éramos unidos como dois gêmeos. Durante 15 dias, no Sanatório de Correias, ouvi a sua dispnéia. E minha irmã Dorinha. Sua agonia foi leve como a euforia de um anjo. E, depois, foi meu irmão Mário Filho. Eu dizia sempre: - “Ninguém no Brasil escreve como meu irmão Mário.” Teve um enfarte fulminante. Bem sei que, hoje, o morto começa a ser esquecido no velório. Por desgraça minha, não sou assim. E, por fim, houve o desabamento de Laranjeiras. Morreu meu irmão Paulinho e, com ele, sua esposa Maria Natália, seus dois filhos, Ana Maria e Paulo Roberto, a sua sogra, D. Marina. Todos morreram, todos, até o último vestígio.

Falei do meu pai, dos meus irmãos e vou falar também de mim. Aos 51 anos, tive uma filhinha que, por vontade materna, chama-se Daniela. Nasceu linda. Dois meses depois, a avó teve uma intuição. Chamou o Dr. Sílvio Abreu Fialho. Este veio, fez todos os exames. Depois, desceu comigo. Conversamos na calçada do meu edifício. Ele foi muito delicado, teve muito tato. Mas disse tudo. Minha filha era cega.
Eis o que eu queria explicar a Marcelo: - depois de tudo que contei, o meu medo deixou de ter sentido. Posso subir numa mesa e anunciar de fronte alta: - “Sou um ex-covarde.” É maravilhoso dizer tudo. Para mim, é de um ridículo abjeto ter medo das Esquerdas, ou do Poder Jovem, ou do Poder Velho ou de Mao Tsé-tung, ou de Guevara. Não trapaceio comigo, nem com os outros. Para ter coragem, precisei sofrer muito. Mas a tenho. E se há rapazes que, nas passeatas, carregam cartazes com a palavra “Muerte”, já traindo a própria língua; e se outros seguem as instruções de Cuba; e se outros mais querem odiar, matar ou morrer em espanhol - posso chamá-los, sem nenhum medo, de “jovens canalhas”.

[14/1/1968]

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

- Memórias do Cárcere -

Pois é meus caros amigos!

Estive no Cárcere durante este ano de 2008 e trago novidades! O Cárcere ao qual desta vez me refiro é o cárcere acadêmico. Uma nova forma de prender a mente em torno de um conteúdo pronto e muito pouco maleável. Creio eu que uma faculdade hoje se preocupa com muitos parâmetros. Quase todos inúteis. São aqueles que, através de princípios arbitrários constroi-se um igualitarismo que, para variar, castra dos estudantes qualquer tipo de originalidade que este possa desenvolver. Quando se está na aurora do ensino médio achamos, ingênuos, que quando entrarmos para uma universidade construiríamos o conhecimento através de pesquisa e estudo. Mentira. Ouso dizer que os estudantes universitários decoram mais receitas de bolo do que os estudantes de quinta série (perdão, sexto ano).

Acontece o abominável. O incabível. O intolerável. Saimos bachareis em xérox e colas de borracha, onde o mecanismo científico mais apropriado é o utilíssimo "ctrl c" e "ctrl v".

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

- EU ESTOU DE OLHO -


Impressionante notar a eficácia dos artifícios publicitários quando estes se propõem a imprimir ou ratificar atitudes no imaginário comum. Com este mecanismo, os publicitários constroem estruturas fictícias que se confundem facilmente com a realidade, de forma a tornar o seu produto ou marca aceitável, validando-a. Quando lidamos com bons comerciantes, somos induzidos à compra de um determinado produto que não necessariamente se dará pela qualidade do produto em si mas pela imagem que construímos dele, tornando-o indispensável para a nossa vida. Estas estratégias são as que definem se o consumidor irá optar por esta ou aquela marca. A qualidade, o conteúdo e a lógica não entram no mérito. O problema acontece quando este produto é vendido por aqueles que representam o nosso Estado.

Gostaria de fazer ao leitor um convite: assistir a última propaganda da Justiça Federal. O produto vendido em questão é a democracia. O Público-Alvo são os brasileiros obrigados a votar.

Para aqueles que nunca assistiram à propaganda, farei uma breve descrição: dentro de uma sala de aula, a professorinha ensina a sua turma (eleitores) como exercer a democracia através da repetição exaustiva do Jargão “Eu estou de olho” em concordância do verbo com os pronomes pessoais. Enquanto a professorinha faz a sua turma repetir uníssona tal concordância, um locutor fala sobre a importância do voto e questiona o telespectador se ele “está de olho” no trabalho daqueles que foram eleitos para os cargos públicos. Para isso, o locutor cita os cargos eletivos: deputado federal, deputado estadual, senador, governador, presidente da República, blá blá blá. No final, o locutor diz que o voto vale tanto quanto o Brasil.

Admito que nunca vi uma demonstração mais risível de inércia política. A propaganda em si é uma piada. Se caminharmos pelo pensamento lógico, veremos que ninguém que repete frases feitas de maneira mecânica pode fiscalizar alguma coisa. É quase um deboche. Além do mais, se formos otimistas e pensarmos que o cidadão lembra perfeitamente em quem votou nas últimas eleições, isto nada valeria se o cidadão não souber distinguir o cargo de senador ao de um prefeito, o cargo de um deputado ao de um presidente. Creio que para se fiscalizar um deputado, é necessário saber o que é uma “Câmara dos Deputados”. Da mesma forma, para se fiscalizar o Presidente, é necessário saber quais os poderes a ele concedidos como chefe de governo e Chefe de Estado. Sem o prévio conhecimento do funcionamento dos três poderes, do que adianta um cidadão comum “estar de olho”?

Esfacela-se a democracia a partir do momento em que o povo, elemento para o qual o governo é destinado, não conhece as instituições de seu país e, pior do que isso, trata de se afastar delas constantemente. A distância entre representantes e representados é uma realidade que se imprime em cada eleição para cargos públicos, não importa se na esfera federal, estadual ou mesmo municipal. Cada vez mais o povo vota de acordo com o “santinho” que este recebe nas bocas de urna, a cada eleição os votos “brancos e nulos” aparecem em crescente volume ao ponto de rivalizar com os “votos válidos”.

Este é o resultado de uma estrutura política ineficiente, demagoga e viciada onde a credibilidade e a idoneidade de instituições centenárias são postas à prova. O produto da publicidade elaborada pela Justiça Federal nada mais é do que a prova cabal de que a democracia no Brasil está profundamente comprometida.

De que adianta mandar o cidadão humilde “ficar de olho” no deputado ou vereador de sua cidade se ele não sabe O QUE É um deputado ou um vereador? Este tipo de brincadeira é inadmissível num país tão carente de orientação cultural e política.

As tentativas de se afirmar um estado democrático servem apenas para justificar a dominação de grandes oligopólios (partidos) sobre os privilégios de seu poder (estado). A política afasta-se de sua real finalidade que é a proteção do Bem Público para assumir uma condição de usufruto do poder sem procedentes! O estado serve apenas para sustentar partidos e os partidos para se beneficiar do estado. Enquanto um novo episódio de corrupção se aproxima, o estado brasileiro vê-se na árdua tarefa de afirmar incontáveis vezes tal democracia fajuta que muito mais assombra do que governa. Não se pode haver democracia sem um povo livre e ciente de sua cidadania. Aquele que usa as mazelas do povo para a auto-promoção política não tem autoridade para falar em democracia. O voto conseguido através da manutenção da miséria não vale tanto quanto o Brasil. Vale tanto quanto à corrupção e tanto quanto aqueles que a praticam.

domingo, 13 de janeiro de 2008

A Verdade sobre a Monarquia


Os nossos manuais de História, ou melhor, de ESTÓRIA – os mesmos que pintam os próceres e fundadores da nacionalidade e os grandes vultos da História Pátria como verdadeiros “monstros” ou então “bufões” e que, à luz dos ensinamentos de Marx, reduzem toda a epopéia de nossos maiores, de nossos antepassados, a uma questão de interesses estritamente econômicos – costumam colocar o golpe de Estado que derrubou a Monarquia naquele fatídico 15 de novembro de 1889 como um fato que apenas teria apressado o inexorável ocaso de um Império que – segundo eles – era anacrônico e condenava o Brasil ao atraso.Não é preciso pesquisar muito, entretanto, para se chegar à conclusão de que nosso Império nada tinha de anacrônico, que, longe de representar um obstáculo ao desenvolvimento nacional, constituía a Coroa uma espécie de alavanca que, conciliando Tradição e Progresso, impulsionava a evolução econômica e social do País, e que o período monárquico, ao contrário do republicano, foi caracterizado sobretudo pela Ordem e pelo Progresso.O Império não foi perfeito, como bem observou Paulo Napoleão Nogueira da Silva, na introdução de sua obra “Monarquia: verdades e mentiras”, publicada pelas Edições GRD em 1994, já que nenhum regime é perfeito, “porque em todos está presente o elemento ‘erro’, a falibilidade que é própria dos seres humanos”.A maior parte dos não poucos erros e falhas do Império, tanto no plano religioso como no político-social, decorre da influência nefasta das idéias liberais surgidas na Europa dos séculos XVII e, sobretudo, XVIII.Todos esses erros e falhas, porém, nem sequer de longe se comparam a todos os erros e falhas da República, regime em que não há – como assinalou Nogueira da Silva – correspondência natural entre a estrutura do Estado e a “realidade antropológica, sociológica, cultural e histórica” da Sociedade. E é a carência de tal correspondência, como igualmente ressaltou o jurista, “que faz com que a República nos mantenha permanentemente marcando passo, ficando para trás em relação a países menos dotados -, sobretudo, ficando distanciados das nossas naturais perspectivas nacionais”.De modo que a restauração da Monarquia, ainda que seja – como foi durante o Império – influenciada em certa medida por idéias liberais, será o melhor meio de reconduzir o Brasil a seu destino histórico e de construir a Sociedade efetivamente justa, harmônica, fraterna e humana e a Pátria verdadeiramente grande, livre, unida, soberana e democrática com que todos sonhamos.Durante todo o Império este País não teve, como acentuou Nogueira da Silva, sequer “um único dia sob ditadura ou censura à imprensa”, de sorte que não era por acaso que os presidentes argentinos Saens Peña e Bartolomé Mitre se referiam ao Brasil daquele tempo como a “democracia coronada”, a “democracia coroada”; como também não foi por acaso que Thiers, em diferentes discursos perante a Assembléia Nacional Francesa, e William Gladstone, dentre outros, tanto elogiaram o regime monárquico brasileiro.No dia imediato ao da proclamação da República, ao receber o Cônsul Geral do Brasil na Venezuela, Múcio Teixeira, o Presidente daquele país, Dr. Juan Pablo Rojas Paúl – tendo lhe dito que pedisse a Deus para que sua Pátria, governada por um sábio durante meio século, não fosse a partir de então regida pelo primeiro “tirannello” que o Exército lhe apresentasse – exclamou, sincera e profundamente comovido: "Se ha acabado la única República que existia en América: el Imperio del Brasil!"Quase ao mesmo tempo, ao receber o embaixador brasileiro em Quito, o Supremo Magistrado da nação equatoriana lhe ofereceu os pêsames, afirmando em seguida que o Brasil acabara de cometer “o erro mais fatal de sua História!”Em dezembro de 1914, o insuspeitíssimo Senador Rui Barbosa, antigo Conselheiro do Império que se tornara um republicano dos mais ardorosos e destacados, proferiu um memorável discurso ao Senado Federal em que disse:“De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.Esta foi a obra da República nos últimos anos.No outro regime, o homem que tinha certa nódoa em sua vida era um homem perdido para todo o sempre – as carreiras políticas lhe estavam fechadas. Havia uma sentinela vigilante, cuja severidade todos temiam, e que, acesa no alto, guardava a redondeza, como um farol que não se apaga, em proveito da honra, da justiça e da moralidade. Era o Imperador Dom Pedro II.”Quatro anos mais tarde, Monteiro Lobato, em seu artigo intitulado “D. Pedro II” e publicado na “Revista do Brasil”, salientou que “o fato de existir na cúspide da sociedade um símbolo vivo e ativo da Honestidade, do Equilíbrio, da Moderação, da Honra e do Dever, bastava para inocular no país em formação o vírus das melhores virtudes cívicas”.Ainda em “D. Pedro II”, observou o autor de “Urupês” e de “Cidades mortas” que “mais um século de luz acesa, mais um século de catálise imperial e o processo cristalizatório se operaria por completo. O animal, domesticado de vez, dispensaria açamo. Consolidar-se-iam os costumes; enfibrar-se-ia o caráter. E do mau material humano com que nos formamos sairia, pela criação duma segunda natureza, um povo capaz de ombrear-se com os mais apurados em cultura”, sendo que, “para esta obra moderadora, organizadora, cristalizadora, ninguém” - segundo o grande escritor e patriota valparaibano - era “mais capaz do que Pedro II”, não havendo “nenhuma forma de governo melhor do que sua monarquia”.Em julho de 1930, Plínio Salgado – então Deputado Estadual por São Paulo e já um renomado e consagrado escritor e jornalista, tendo publicado, em 1926, a obra “O estrangeiro”, primeiro e maior romance social em prosa modernista de nossa Literatura e havendo depois fundado, ao lado de outros vultos do Modernismo, os movimentos literários conhecidos como Revolução da Anta e Verde-amarelismo – assim afirmou, em sua carta ao Dr. Manoel Pinto, escrita de Milão: “O Império legou à República um país unido, homogêneo, vibrando pelo mesmo coração; a República, com mais vinte ou trinta anos, terá completado sua obra de dissociação”.Observações parecidas estão presentes em muitos dos artigos que o autor de “Psicologia da Revolução” e de “Vida de Jesus” escreveu em sua célebre “Nota Política” no jornal “A Razão”, de que era o redator principal, tendo como companheiros de redação jovens intelectuais como San Tiago Dantas, Mario Graciotti, Alpínolo Lopes Casali, Nuto Sant’Anna, Silveira Peixoto, Nóbrega de Siqueira, Marques Rabelo, Leopoldo Sant’Anna e Gabriel Vendoni de Barros. Em meu artigo intitulado “O negro e o Integralismo”, lembrei a importância deste matutino cujo proprietário era o Dr. Alfredo Egídio de Souza Aranha e que “revolucionou a imprensa da Capital Bandeirante e mesmo do Brasil e acabaria empastelado nos distúrbios de 23 de maio de 1932”.Em fins da década de 1920, surgira em São Paulo o movimento patrianovista, que – inspirado sobretudo nos ensinamentos da Doutrina Social da Igreja e no pensamento de mestres tradicionalistas d’aquém e d’além mar, tais como o sergipano Jackson de Figueiredo, fundador do Centro D. Vital, e o alentejano António Sardinha, principal doutrinador do movimento tradicionalista, patriótico e monárquico conhecido como Integralismo Lusitano – pregava a instauração, no Brasil, de um regime monárquico tradicional como aquele que vigorara nos áureos tempos do Império Lusitano e em que o Estado organizar-se-ia à base da autonomia dos Municípios e das agremiações profissionais, bem como a recatolização de nossa Sociedade, defendendo a Ordem e a Justiça Social.Reunindo diversos intelectuais como Ataliba Nogueira, Sebastião Pagano e Antônio Paim Vieira, o Patrianovismo tinha como principal líder o pensador, poeta, jornalista, escritor e homem de ação Arlindo Veiga dos Santos, que fundou e dirigiu também a Frente Negra Brasileira.Àqueles que desejarem saber mais a respeito do Patrianovismo, recomendo a leitura do excelente verbete dedicado a este movimento por José Pedro Galvão de Sousa, Clovis Lema Garcia e José Fraga Teixeira de Carvalho em seu “Dicionário de Política” – de longe o melhor de quantos tenho lido -, assim como da obra “Império e Missão”, da historiadora Teresa Malatian.Vejamos, agora, algumas das informações que o Dr. Paulo Napoleão Nogueira da Silva colheu em diferentes fontes, todas elas absolutamente insuspeitas, e transcreveu em sua obra já aqui citada.Na edição de “O Estado de São Paulo” de 14 de setembro de 1991, encontra-se a informação de que nos cento e um anos decorridos desde a proclamação da República até aquela data, os preços mundiais elevaram-se em vinte e três vezes, ao passo que no Brasil elevaram-se em nada menos do que trinta e dois trilhões de vezes!Segundo a revista “Finanças Públicas”, editada pelo Ministério da Fazenda, em seu volume 213 (maio/junho de 1960), no Império, entre 1840 e 1889, o menor salário do País era de 25.000 réis, o que equivalia a 22,5 gramas de ouro. Com a República, de acordo com Nogueira da Silva, só cento e três anos mais tarde, em julho de 1993, os trabalhadores conseguiram obter um salário mínimo de CR$ 5.600,00, o que correspondia a apenas 06 gramas de ouro!Da mesma fonte provém a informação de que o maior salário do Brasil Imperial, o de Senador, foi de 300.000 réis; isto é, somente doze vezes maior do que o menor salário. Em princípios da década de 1990, quando Nogueira da Silva escreveu seu ensaio, o salário de Senador da República correspondia a duzentas e quarenta vezes o salário mínimo!É ainda a mesma fonte que afirma que, entre 1840 e 1889, o Brasil teve inflação de 1,58%. Neste mesmo período, a inflação da França, do Reino Unido, dos Estados Unidos e da Alemanha oscilava entre 1,6% e 04%. Nos cento e três anos que separam a imposição da República e o trabalho de Nogueira da Silva, o acúmulo de inflação chegou a cerca de dez trilhões por cento!A “Gazeta Mercantil” informa que, no Império, tinha o Brasil a segunda maior frota mercante do Planeta, da mesma forma que o Ministério da Marinha informa que, naquele período de nossa História, tínhamos a segunda maior esquadra naval do Mundo. Hoje, em 2007, todos sabem o quão longe estamos disto...Provém, por fim, do Ministério dos Transportes a informação de que, durante o II Império (1840-1889), construiu o nosso Brasil cerca de 10.000 quilômetros de ferrovias. A República, em suas primeiras décadas, ampliou até bastante o número de quilômetros de estradas de ferro, mas depois desativou praticamente todas as nossas linhas férreas.Um dos grandes desacertos da República foi o de acabar com o Poder Moderador. Com a extinção deste poder que sustenta, como nenhum outro, o imprescindível equilíbrio entre Autoridade e Liberdade, sem o qual não pode haver uma verdadeira e efetiva Democracia, extinguiram-se, ainda, - como frisou João de Scantimburgo em seu artigo intitulado “Suma de Filosofia do Poder Moderador” e publicado no n° 85 da “Revista Brasileira de Filosofia” (janeiro/fevereiro/março de 1972) – “ e por via de conseqüência, na estrutura das instituições políticas brasileiras, o conselho de Estado, o conselho de ministros, o Senado vitalício e teve início a debandada da classe dirigente, cuja evolução se processou, através do tempo, em torno do cetro imperial.” Segundo o eminente pensador, escritor, jornalista e Imortal, “não atinaram os republicanos do século XIX, nutridos de inspiração alienígena e de doutrina estrangeira, que abriam um vácuo cujo preenchimento se tem feito, durante toda a história posterior do Brasil, por meios aleatórios e, no exato rigor da palavra, por sucedâneos, aos quais falta a consistência das instituições solidamente edificadas no espaço e no tempo”.Nenhum mal foi pior, todavia, do que aquele que Rui Barbosa chamou, no final de sua vida, de “o mal grandíssimo e irremediável das instituições republicanas”, que consiste, segundo a “Águia de Haia”, “em deixar exposto à ilimitada concorrência das ambições menos dignas o primeiro lugar do Estado e, desta sorte, o condenar a ser ocupado, em regra, pela mediocridade”.Tudo o que afirmei até agora, neste artigozinho, pode ser resumido por este pequeno trecho do já mencionado artigo de Monteiro Lobato:“De Norte a Sul o povo lamuria a sua desgraça e chora envergonhado o que perdeu. Tinha um rei, tem sátrapas. Tinha dinheiro, tem dívidas. Tinha justiça, tem cambalachos de toga. Tinha Parlamento, tem ante-salas de fâmulos. Tinha o respeito do estrangeiro, tem irrisão e desprezo. Tinha moralidade, tem o impudor deslavado. Tinha soberania, tem cônsules estrangeiros assessorando ministros. Tinha estadistas, tem pêgas. Tinha vontade, tem medo. Tinha leis, tem estado de sítio. Tinha liberdade de imprensa, tem censura. Tinha brio, tem fome. Tinha Pedro II, tem ... não tem! Era. Não é”.Sabemos que a longa e tenebrosa noite que é a idade materialista logo terá o seu crepúsculo, dando lugar à Aurora da Idade Nova, cujo romper já se anuncia. Esta Idade Nova, que Berdiaeff chamou de “a nova Idade Média”, caracterizar-se-á acima de tudo pelo Primado, pela Primazia do Espírito.Do mesmo modo que a velha e mofada idade materialista dará lugar à Idade Nova, dos escombros de nossa República oligárquica e plutocrática nascerá, segundo Paulo Napoleão Nogueira da Silva, em seu ensaio tantas vezes aqui citado, uma nova Monarquia, pois “a república tem sido uma noite, de agonias intermináveis. Há noites que parecem se prolongar indefinidamente. Mas, é lei natural, não há noite, por mais longa que seja, que não preceda à Aurora.”Também não me resta dúvida de que esta República, que de República, aliás, nada tem, “cairá por terra – como previu Antônio Vicente Mendes Maciel, o profeta sertanejo mais conhecido como Antônio Conselheiro – para confusão daquele que concebeu tão horrorosa idéia.” Se será substituída por uma “Democracia Coroada” ou por uma nova República em que os representantes do Povo serão todos homens competentes, íntegros e honestos, só o futuro responderá.Saibamos, porém, que, caso advenha o III Império, será ele imensamente mais glorioso do que o II, da mesma forma que a “nova Idade Média” será enormemente mais grandiosa do que a antiga.


FONTE:

Artigo de Autoria de Victor Emanuel

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Aristóteles e os atuais modelos de Estado


Acredito que as formas de governo são substituidas uma pelas outras devido à sua inconstância em promover o seu bem essencial. A manutenção do que é correto para os cidadãos e ao bem público.



Segundo as formas aristotélicas, temos 3 saudáveis e outras 3 que seriam a perversão destas. Logo chegaríamos à concordância:



- Monarquia => Tirania



- Aristocracia => Oligarquia



- Democracia => Demagogia.



Eis o governo de "um" de "poucos" e de "Muitos".



Ora, a perversão da Monarquia é a Tirania pois o monarca passa usar os poderes do estado em benefício próprio, tomando o estado para si. O povo passa a servir unicamente aos desígnios do Tirano. Neste ponto, as relações do tirano com seus súditos e com a sua "elite" tem base no poder e no dinheiro e nunca no mérito. O tirano cerca-se de oportunistas e bajuladores; homens em busca de prestígio e fácil ascenção social. Este tipo de governo pode ser semelhante hoje às monarquias absolutas e nas repúblicas presidencialistas: em ambas o monarca ou o Presidente é chefe de estado e governo. A diferença está na natureza dos cargos. No primeiro caso, ele é hereditário e vitalício; no segundo caso é eletivo e temporário. Acredito ser a monarquia absoluta mais estável do que o seu modelo republicano, o presidencialismo. As outras diferenças entre as duas não serão mencionadas pois fogem ao assunto do tópico.



Sendo a Aristocracia o governo dos melhores há, naturalmente, uma recompensa em natureza de suas obras e suas ações. Portanto, a corrupção da aristocracia é a oligarquia. No primeiro, governa-se pela virtude. O segundo, governa-se pelo dinheiro e pelo poder. Comparo esta forma de governo a um parlamento. Quando o estado é saudável e justo, destacam-se entre os estadistas os melhores. Quando este é corrupto, destacam-se aqueles com maior poder e fortuna. Uma elite intelectual é fundamental para o desenvolvimento do país. Sem ela, o país perde-se nas mãos de aventureiros. Com ela, pensa-se com responsabilidade nos rumos da nação.



Quando Aristóteles refere-se ao Demagogo, ele explica que o Demagogo é aquele que busca a esperança do povo para benefício próprio. Sendo assim, ele proclama a sí próprio representante dos direitos do povo e, ao mesmo tempo, personifica a figura do povo de maneira que qualquer questionamento de sua legitimidade seja interpretado como o questionamento da legitimidade popular. Este ponto é o mais comum nos dias de hoje, principalmente entre nações politicamente fragilizadas por formas de governo corruptas com é o caso do Brasil. É necessario para o bem da democracia que este povo saiba exercê-la. Como já disse, há uma diferença abismal entre "Cidadãos" e "todos". Na prática, de fato, isso não funciona. A cidadania é o reconhecimento do estado em relação à função civil e social de um indivíduo, tornando a massa de indivíduos cidadãos iguais juridicamente perante ao estado. A própria palavra "cidadania" já remete esta pluralidade se pensarmos em "direitos cívicos atribuidos aos cidadãos". O cumprimento destes direitos é o que caracteriza de fato a cidadania e a cidadania é o foco da democracia. Ora, todos os cidadãos são regidos pela lei e não são simplesmente "semeados aos ventos" da nação.



A monarquia constitucional parlamentar é, portanto, o único modelo capaz de unir as 3 resoluções de Aristóteles e consequentemente é o modelo mais estável para o país. Temos um monarca que é a vigilância máxima da nação (monarquia) e representante da mesma; temos um parlamento com seus devidos poderes constitucionais em prol dos cidadãos (aristocracia) e temos os cidadãos que com o cumprimento de seu direito faz-se representar no parlamento (democracia).



Sendo assim...



"Para a boa ordem do mundo, a Monarquia é necessária." Dante Alighieri